O benefício do conhecimento tribal no chão de fábrica

Do conhecimento tribal ao digital no chão de fábrica

Historicamente, o chão de fábrica sempre dependeu do conhecimento tribal, da experiência boca a boca e da percepção coletiva dos funcionários continuamente transmitidos ao longo do tempo em uma empresa.

O conhecimento tribal é definido como aquele compartilhado dentro de um grupo de pessoas, mas desconhecido fora dele. Uma tribo industrial, nesse sentido, é um grupo de pessoas que compartilham um conhecimento, um senso comum no chão de fábrica.

O problema não é a fábrica ser dependente do conhecimento tribal, mas a manutenção de registros inconsistentes ou inexistentes, que poucos fora deste grupo sabem que existem.

Ou seja, quando esse conhecimento não é capturado e compartilhado, ele se perde para sempre, causando danos irreparáveis para a organização.

Assim como fluxos de trabalho, relatórios e processos de máquinas são digitalizados e documentados, os conjuntos de conhecimentos e habilidades dos funcionários da fábrica também devem ser documentados digitalmente e disponíveis em uma base de conhecimento.

A retenção de funcionários e do conhecimento da fábrica é fundamental para o sucesso da manufatura. Assim como é para qualquer outro ramo de negócio.

O conhecimento tribal é compartilhado informalmente

Os gestores nas indústrias podem ter se beneficiado do conhecimento tribal, sem nem mesmo perceber. Pense no seu primeiro dia de trabalho. Você encontra um obstáculo e pergunta a um colega de equipe como resolver o problema. Talvez ele responda com: “O José me ensinou esse truque …” ou “Pergunte ao Antônio: ele sempre faz a copiadora funcionar novamente”.

O conhecimento tribal refere-se às informações coletivas e não escritas e à experiência que existe em uma organização ou em um grupo específico de indivíduos.

Em geral, esse conhecimento é acumulado ao longo do tempo por meio de experiências pessoais, interações e práticas compartilhadas em um grupo próximo. Isso inclui percepções, práticas recomendadas, procedimentos informais e outras informações valiosas que podem não estar documentadas, mas que são cruciais para o funcionamento eficiente de uma determinada organização ou equipe.

Tudo funciona bem, mas sem se saber exatamente como. A informatização dos processos de negócios pode organizar muito conhecimento, mas esta sabedoria nem sempre é registrada formalmente em manuais.

A sabedoria de quem põe a mão na massa

Um funcionário pode ouvir os ruídos de uma máquina e saber o que está errado com ela. Nenhum manual de máquina diz que três ruídos agudos significam que a correia do ventilador está prestes a se romper, mas um funcionário atento prevê e evita constantemente a falha da máquina antes que ela se torne um problema.

Em seu automóvel, às vezes você percebe barulho quando passa por uma lombada, e logo percebe que a suspensão pode ter um pivô de suspensão ruim, ou o coxim do motor quebrou.

Numa empresa, um funcionário criou um programa de software anos atrás que é fundamental para a produção. Quando ele saiu, nenhuma atualização do software pôde ser feita porque ninguém mais entendia a codificação.

Funcionários antigos se aposentam

Algumas empresas contam com gerentes de chão de fábrica experientes, com mais de 30 anos de conhecimento operacional, mas não capacitam outras pessoas no chão de fábrica para assumir essas tarefas quando a aposentadoria se aproxima.

Embora o conhecimento tribal seja inestimável, as organizações também devem estar atentas à documentação e à formalização das informações essenciais para garantir a continuidade, especialmente quando os funcionários se aposentam ou partem para outras oportunidades. Trocar de emprego hoje em dia é rotineiro em tempos de alta competitividade entre empresas, e os funcionários querem mudar para a empresa que paga mais. Eu já fiz isso e tentamos aqui que isso não aconteça com os nossos melhores colaboradores, mas este é outro desafio que rende uma boa conversa.

O conhecimento tribal também pode representar um risco

O conhecimento coletivo, quando é registrado, ele se torna algo diferente: conhecimento institucional, que não depende de nenhum indivíduo; são dados e processos que estão incorporados nas ferramentas e nos processos documentados da organização e que, portanto, podem beneficiar a todos.

Sistemas de gestão modernos devem contribuir para salvar o conhecimento

Com a modernização e digitalização dos processos empresariais, um software de gestão – podemos aqui citar o CRM e o Service Desk – pode contribuir significativamente para capturar o conhecimento tribal e transformá-lo em conhecimento institucional, fornecendo uma plataforma que possa centralizar os dados, oferecer suporte à personalização, permitir o monitoramento em tempo real e facilitar a colaboração entre os processos de uma empresa.

Se é verdade que o conhecimento tribal costuma ser passado dos mestres artesãos para os aprendizes, o fato é que no mundo de hoje nos negócios a rotatividade é muito grande.

A rotatividade constante causa erros e falta de conhecimento operacional geral. Isso pode levar a problemas de segurança, menor qualidade do produto e tempo de produção mais lento.

Os novos funcionários precisam aprender a se virar sozinhos rapidamente e o desafio é como passar o conhecimento dos especialistas para os novatos de forma mais rápida do que nunca. A verdade é que ninguém aperfeiçoou isso, ainda.

Telefone sem fio do conhecimento

O conhecimento tribal pode ser como um jogo de telefone sem fio: quando é transmitido ao longo dos anos de funcionário para funcionário, ele pode estar incompleto ou distorcido. Uma solução completa e clara pode estar disponível, mas os trabalhadores podem presumir que uma solução parcial é a única solução.

Apesar da importância histórica do conhecimento tribal, a dependência dele pode levar à supressão da criatividade e inovação. Talvez existam maneiras melhores de lidar com o problema, mas se os funcionários tiverem muito medo de ofender o criador original do processo ou se forem recebidos com gritos de “é assim que sempre foi feito, não mexa no sistema”, eles ficarão rapidamente desanimados e/ou ineficientes.

Do conhecimento tribal ao digital no chão de fábrica

No ambiente dinâmico da manufatura atual, é preciso haver uma transferência estratégica e documentada de conhecimento, transformando o tribal em conhecimento institucional.

O conhecimento institucional desempenha um papel fundamental na implementação bem-sucedida da Indústria 4.0 e das iniciativas de transformação digital. A Indústria 4.0 é caracterizada pela integração de tecnologias digitais, pela tomada de decisões orientada por dados e pela convergência de sistemas físicos e digitais. O aproveitamento do conhecimento institucional nesse contexto pode contribuir de várias maneiras:

1 – A otimização de processos se beneficia de percepções históricas.

O conhecimento institucional abrange percepções obtidas de experiências e operações passadas. A análise desses dados históricos pode ajudar a identificar ineficiências e áreas de melhoria nos processos de fabricação.

Os funcionários com conhecimento tribal podem contribuir para os esforços contínuos de otimização de processos e melhoria contínua, fornecendo percepções e sugestões com base em suas experiências práticas, capturando esse conhecimento tribal em processos documentados.

2 – A consciência do contexto é fundamental para interpretar dados e tomar decisões.

Os funcionários com conhecimento tribal compreendem profundamente o contexto em que as decisões são tomadas. Esse é um componente essencial da tomada de decisões orientada por dados. A exposição desse contexto por meio de software de monitoramento e geração de relatórios torna esse contexto disponível para todos. Quando ocorrem anomalias ou eventos inesperados nos dados, esse contexto pode fornecer informações sobre as possíveis causas e recomendar respostas adequadas.

3 – O conhecimento institucional na adoção e integração da tecnologia.

É importante que os fornecedores de tecnologia prestem muita atenção ao conhecimento tribal existente em seus clientes. Isso porque os funcionários familiarizados com a história e as operações da empresa cliente podem contribuir para a seleção estratégica de tecnologias que se alinham às metas e aos valores da organização.

Essas tecnologias, então, reforçam essas metas e valores e esse alinhamento pode garantir uma integração tranquila entre as novas tecnologias com os sistemas legados, evitando interrupções e maximizando os benefícios da transformação digital.

4 – O conhecimento institucional na mitigação de riscos.

Os funcionários com conhecimento tribal, em geral, estão mais bem equipados para identificar possíveis riscos associados à adoção de novas tecnologias ou mudanças nos processos. Podem contribuir para o desenvolvimento de estratégias de mitigação, baseando-se em suas experiências para prever e enfrentar desafios. Transformar seu conhecimento tribal em estratégias de mitigação documentadas captura seu conhecimento para a instituição.

Na busca para evitar a extinção do conhecimento tribal no chão de fábrica, capturar e aproveitar o conhecimento institucional por meio de sistemas de gestão e do chão de fábrica não é apenas uma necessidade, mas um imperativo estratégico. Promover a integração entre os sistemas legados é mandatório nos dias de hoje.

À medida que as indústrias navegam nesta era transformadora da Indústria 4.0, garantir a sobrevivência do conhecimento institucional deve se tornar um princípio orientador para os gestores, assegurando que a evolução do chão de fábrica não seja apenas inevitável, mas que seja perfeitamente otimizada para o sucesso sustentado no cenário dinâmico da manufatura moderna.

Como Carl Sagan sabiamente observou, “A extinção é a regra. A sobrevivência é a exceção“. No contexto da manufatura, o conhecimento institucional representa a sobrevivência, a exceção que detém a chave para a evolução do setor.

 

Rodney Repullo – CEO da Magic Software Brasil

 

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